sexta-feira, 8 de março de 2013

Entrevista com Sônia Zanchetta


 
Por Jacira Fagundes
Coordenação conjunta com Christian David
AEILIJ –  Regional RS
Publicada no Boletim da AEILIJ, na edição de novembro de 2011


                             Uma entrevista que vale a pena conferir!



Jornalista formada pela PUC/RS e produtora cultural,  Sônia Zanchetta integra a comissão executiva da Feira do livro de Porto Alegre desde 1997. Coordena a área Infantil e Juvenil e o ciclo  A Hora do Educador do evento, além da área internacional. Sua equipe se ocupa, ainda, dos programas  Adote um Escritor ( parceria SMED Porto Alegre), Lendo pra Valer ( parceria Secretaria de Estado da Educação) e Fome de Ler ( parceria cursos de Letras ULBRA  Guaíba e Canoas, prefeituras de Canoas e de doze municípios da Região Centro-Sul do Estado e Rede ULBRA de Escolas).
 

AEILIJ – Sônia, fale um pouco sobre esta paixão que te impulsiona para toda uma dedicação e empenho nas ações voltadas à literatura infantil e infantojuvenil  no Estado.
Sônia Zanchetta -  Minha paixão pela leitura e pela literatura começou cedo, antes mesmo de eu ir à escola, pois tive a sorte de vir ao mundo em uma família que dava valor aos livros.
Minha mãe havia guardado, “para quando tivesse filhos”, duas preciosidades: a coleção completa de Monteiro Lobato  e os 18 volumes do Thesouro da Juventude. Apesar da ortografia ultrapassada, li e reli inúmeras vezes todas as histórias daqueles livros. E isso não me dificultou em nada a aprendizagem da Língua Portuguesa; ao contrário, fez com que passasse a amar a leitura e a escrita. Por isto, não consigo aceitar que livros sejam triturados ou doados para reciclagem cada vez que há uma reforma ortográfica.
Meu pai, que havia frequentado a escola por apenas três anos, redescobriu o prazer da leitura junto conosco, quando começou a febre das enciclopédias. Passava horas mergulhado naqueles livros e, de vez em quando, levantava os olhos e nos chamava para contar algo interessante que acabara de descobrir. Ali estava a prova de que uma pessoa que sai da escola plenamente alfabetizada pode seguir aprendendo por conta própria até o fim de seus dias.


AEILIJ – Tens encontrado, com certeza, alguns desafios no desenvolvimento de projetos que visam incrementar a leitura entre crianças e jovens. Dentre eles, qual o maior desafio?
SZ – Creio que o maior desafio está,  justamente em se promover a valorização da leitura no imaginário coletivo. Quando a família, a escola, o poder público e a sociedade como um todo entendem a importância da leitura, a coisas começam a andar.
Através do meu trabalho na Câmara Rio-Grandense do livro, tenho acompanhado vários programas e projetos de leitura desenvolvidos no Estado. Não conheço nenhum caso em que o começo tenha sido fácil. Em termos gerais, é preciso muita persistência e uma grande capacidade de persuasão para fazer um gestor público destinar verbas em volume suficiente para esta área.
Menos mal que esta situação começa a se reverter em vários municípios gaúchos, que construíram políticas públicas claras e consistentes para o livro e a leitura, tornando-se referência em nível nacional.


AEILIJ – E na Feira do Livro de Porto Alegre que acontece a cada ano, na área infantil, podes citar as questões mais desafiadoras?
SZ – Um dos maiores desafios que a equipe da Área Infantil e Juvenil enfrenta é o de sensibilizar para que a Feira seja compreendida como o ponto culminante, mas não final, de um processo sério e contínuo de formação e qualificação de leitores. Ao agendarem suas turmas para encontros com escritores e ilustradores de LIJ, os professores assumem o compromisso de promover a leitura prévia de ao menos uma obra de sua autoria por todos os alunos e por todos os adultos que os acompanharão na visita à Feira.
A feira é a grande festa do livro. Além de participarem das atividades oferecidas pela programação, as escolas encontram, ali, espaço para mostrar o trabalho desenvolvido, ao longo do ano, nas áreas da leitura e da escrita. Para acolher esta produção, foram criados o teatro Território das Escolas; o Largo da Escrita, onde ocorrem sessões de autógrafos, e a Vitrina da leitura, que dá visibilidade a projetos que se destacam por sua consistência, constância e caráter inovador. Há escolas que levam à Feira centenas de membros da comunidade escolar, o que é fundamental para reforçar a importância da leitura no contexto familiar. Mas é preciso, também, qualificar os professores como leitores e mediadores da leitura.  Com este objetivo, a CRL realiza ou apoia a realização, ao longo do ano, de vários encontros que têm sua culminância na Feira, com o ciclo A Hora do Educador. Este ano ( 2011) estão previstos nove seminários, além de várias oficinas e palestras independentes.


AEILIJ – Consideras que as novas tecnologias ajudam ou afastam os pequenos e os jovens da leitura? Onde, na tua opinião, é possível a leitura se coadunar às novas tecnologias ou, se for o caso, prevenir o afastamento?
SZ – Embora o livro de papel continue sendo o único suporte de leitura em boa parte das escolas brasileiras e tudo indique que terá uma longa vida, é essencial que os professores se preparem para tirar proveito das novas tecnologias, que tanta curiosidade despertam entre seus alunos.
Não basta equipar as escolas com laboratórios de informática, telecentros ou salas de aula do futuro. É preciso romper a resistência de muitos professores com relação a seu uso, fazendo com que se conectem ao tempo de seus alunos. Só assim poderão fazer a mediação necessária para que seus alunos se tornem aptos não só a consumir, mas também a criticar e a produzir conteúdos digitais.


AEILIJ – Vimos acompanhando expressivo aumento do número de obras direcionadas à infância e juventude no âmbito da literatura gaúcha. Até onde tal fato é promissor e significativo de qualidade?
SZ – A LIJ  produzida no RS deu um salto de qualidade incontestável nos últimos tempos. Autores gaúchos de LIJ circulam com desenvoltura nos grandes eventos literários do país; tem obras selecionadas pelo PNBE e por outros programas de aquisição; conquistam prêmios importantes, espaços na mídia especializada e nas estantes das megalivrarias.
Há algum tempo, podemos observar na Área Infantil e Juvenil da Feira do Livro de Porto Alegre a atuação de “olheiros” de editoras do centro do país, que vem conhecer de perto os nossos autores.
Mas é essencial que as escolas adotem critérios claros para a aquisição de acervo e adoção de obras a serem lidas por seus alunos, pois,  nestes tempos em que é tão fácil publicar um livro, abundam também os textos de baixa ou nenhuma qualidade literária.
AEILIJ – Neste momento profícuo para a literatura infantil e infanto-juvenil, vês visibilidade para os novos – tanto escritores como ilustradores?
SZ – Aqui no Sul há poucas editoras que apostam na publicação de LIJ com recursos próprios, o que dificulta  a entrada de novos autores no mercado e, no caso das obras publicadas de forma independente, mesmo que seja incontestável sua qualidade, a distribuição costuma ser bastante difícil. No entanto, temos o exemplo de autores que surgiram através de concursos literários ou que construíram sua reputação literária na internet e, só depois de terem conquistado uma legião de leitores, foram em busca de uma editora ou publicaram um livro de forma independente. Oficinas literárias ministradas por grandes escritores, como Luiz Antônio de Assis Brasil e Charles Kiefer, entre outros, também têm contribuído de forma decisiva para o surgimento e a qualificação de autores no RS. Atualmente contamos com excelentes ilustradores no RS, mas, também no seu caso, o começo não é fácil, sobretudo pela escassez de editoras especializadas em LIJ.


AEILIJ – Ainda, no que se refere à obra literária de qualidade, como vês a atual profissionalização de escritores e ilustradores? A AEILIJ pode auxiliar na profissionalização destes autores de texto e ilustração? De que maneira?
SZ – A AEILIJ vem colaborando para a profissionalização de escritores e ilustradores associados ou não, através da promoção de debates e reflexões sobre a questão da produção e da leitura de LIJ. É o caso do seminário POR UM ESPAÇO ESPECIAL PARA A LITERATURA NA ESCOLA, que terá sua terceira edição de 8 a 10 de novembro, na 57ª Feira do livro de Porto Alegre.
Mas,  no RS, e provavelmente em vários outros estados, seria importante que a entidade pudesse promover, também, oficinas de criação, ministradas por ilustradores ou escritores de renome, visando a profissionalização  de novos autores.

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